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Pensar Mata



Os seus olhos filmavam o cigarro aceso na mão direta

Preso pelos dedos pensativos que a conduziam para as unhas pintadas de vermelho escuro

O cabelo castanho dourado procurava protagonismo em cena

Mas rapidamente era reduzido à sua indiferença

Não fosse o drama do suicídio aceite pela sociedade o que mais vende numa sala de cinema

Fumar é a incoerência mais coerente do ser humano

A dissonância cognitiva mais racional da existência

A dita absurda decisão da redução de vida consciente

Diluída na mais pura coragem de acelerar o passo até ao transcendente

E o ritual mais inesperado de meditação

O processo de inalar toxinas para a libertação

Sempre que um cigarro pausava a sua rotina

Pensava no porquê de estar a condenar a própria narrativa

Mas o questionamento interminável e saturado

Tornava-se ligeiramente mais cinematográfico e suportável quando acompanhado

A dor de pensar

A dor de existir com pensamento

A dor da impossibilidade de saída do próprio questionamento

A dor da conclusão da permanente ignorância a todos condenada

E a única solução para tal aperto - o fingimento

Esse do cinema e do teatro

O fingir uma personagem

E fingi-la permanentemente

Fingir a amizade e o amor

A inveja a dor

Até o sucesso e o fracasso

Dessa atriz protagonista, fumadora e condenada

Que fingia planos de unhas pintadas de vermelho

E pensamentos nos quais mais ninguém pensava

Falava-se na terceira pessoa

Fingia não ser uma romântica incurável

Apenas uma analista racional

Ou uma sonhadora moderada

Sonhadora porque pensava tanto como um realizador

Moderada por ao papel de atriz estar limitada

Talvez a alternativa fosse imitar Woody Allen

Ser o dois em um na realidade

E conceber o filme trágico do que é ser neste casting de vaidade.


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